De onde vem o nome da comunidade Café sem Troco?
A cerca de 50
quilômetros do centro de Brasília e dentro da região administrativa do Paranoá,
uma comunidade de 20 mil habitantes recebeu o nome de "Café Sem
Troco". De acordo com a administração, os primeiros moradores do núcleo
rural se instalaram lá em 1976.
Poucos anos depois,
uma vendinha daria nome ao lugar. O antigo proprietário, Ananias Neres
Trindade, mais conhecido como "Barbudo", não se recorda com exatidão
o ano em que abriu o comércio com o irmão, mas acredita que tenha sido em 1979.
A vendinha de
madeira ficava no entroncamento da DF 130 com a BR 251, duas rodovias de grande
fluxo. Cerca de três mil veículos passam naquele trecho diariamente, de acordo
com o Departamento de Estradas de Rodagem (DER). Por causa dessa movimentação,
"Barbudo" decidiu que seria lá o comércio, voltado principalmente
para os caminhoneiros.
A época, no entanto,
não favorecia os trocos. A moeda era o "cruzeiro", que havia se
desvalorizado frente ao cruzeiro novo e surgiram cédulas de valor alto. Além
disso, os caminhoneiros costumavam carregar muito dinheiro ao viajar, o que
dificultava ainda mais. No entanto, "Barbudo" não negava o produto ao
viajante.
O morador Francisco
das Chagas Silva Lemos testemunhou a vendinha ainda aberta. "Lá só vendia
'cafézin', pinga e baralho todo dia. Mais nada. Era o que tinha lá. Eu passava
do trabalho, tomava uma pinga e vinha embora, que já era de noite",
resume.
Com o crescimento da
região e o aumento da concorrência, Barbudo abandonou o negócio. Ele continua
morando no Café Sem Troco e se nega a revelar a receita do café que deu origem
ao nome do lugar. "Tradição de pai e mãe", diz. Mas conta que se
sente orgulhoso do legado que deixou. "A gente faz uma coisa que dá
sucesso, a gente fica orgulhoso, né? Nem que não seja para mim, mas seja para
os outros".
A estrutura de
madeira que antes era a vendinha continua no mesmo ponto, mas usada como local
de descarte de lixo. Ao redor do que foi o comércio do Barbudo, agora há um
supermercado, uma lanchonete e uma borracharia. Os caminhoneiros continuam
parando ali para descanso.
Pertencimento
Na visão do
linguista Carlos André Nunes, o nome "Café Sem Troco" foge do comum.
A tendência, segundo ele, é que o nome de um lugar traga um aspecto geográfico
ou etimológico. "A impressão que me dá, como linguista, é que Café Sem
Troco tem muito mais a percepção popular, do nativo, daquele que vive na cidade
e que consequentemente transforma a cidade em um ambiente próprio, em um
ambiente seu", avalia.
Para comparar, Nunes
cita o exemplo de Petrópolis, município do Rio de Janeiro. O nome vem de uma
homenagem ao imperador Dom Pedro I. "Petrus" vem do latim e significa
"Pedro", e "Polis" vem do grego e se traduz
"cidade".
"Toda essa
lógica de homenagem é uma lógica muito mais formal e que naturalmente afasta a
origem dessa cidade daquele seu povo. Com certeza, Café Sem Troco [nome] tem em
si muito mais do Café Sem Troco [comunidade] do que Petrópolis tem em relação a
Pedro", explica Nunes.
Café Sem Trocoense
Questionado sobre
como seria o gentílico de um nativo do Café Sem Troco, o linguista faz
neologismos, com bom humor. "Podemos pensar em Café Sem Trocoense, por
exemplo, ou Café Sem Trocoano. São duas possibilidades. São sufixos que indicam
o chamado adjetivo gentílico, que é aquele que traduz o povo ou o sentimento de
povo que existe em determinado local", brinca.
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