Seu Distrital, o que ele propõe?
Obrigar bares e restaurantes a servirem café sem açúcar, oferecer inscrição gratuita em concursos públicos para quem está desempregado, pôr fim ao horário de verão, proibir os usuários do transporte público de ouvirem música sem fone de ouvidos nos ônibus e no metrô. Propostas de leis apresentadas pelos distritais da atual legislatura, elas revelam que, além da baixa frequência dos parlamentares na Casa — em uma semana em que eles decidiram ter sessões só às terças-feiras —, parte da produção deles pode ser considerada de qualidade duvidosa. “O que verificamos é uma falta de cuidado com muitas propostas que são apresentadas. Os deputados deveriam se ocupar mais com coisas úteis”, critica o Gil Castelo Branco, fundador e secretário-geral da organização não governamental Contas Abertas.
Entre os assuntos que mais mobilizam os distritais, está a inclusão de datas comemorativas no calendário oficial do Distrito Federal. Desde 2011, foram 83 projetos. Agaciel Maia (PTC) criou o Dia do Reggae; Evandro Garla (PRB) instituiu o Dia do Obreiro Universal; enquanto Luzia de Paula (PEN), antenada com as novas tecnologias, sugeriu homenagem aos blogueiros. Os servidores públicos — agentes de saúde, procurador legislativo, técnicos penitenciários, entre outros — são alvo de várias propostas. “Observamos uma banalização nessas sessões de homenagens. Elas servem muito mais ao parlamentar do que ao próprio homenageado”, destaca Castelo Branco.
Esporte, lazer e temas relacionados aos idosos também são assunto constante na pauta: dias do jiu-jítsu, do criador de pássaros silvestres, do policial civil aposentado, da mídia comunitária, do trilheiro, do sertanejo, entre muitos outros. Às vezes, aleatória, a mobilização em torno de um tema/categoria mantém relação com as origens dos deputados. Ligado à área de segurança pública, Wellington Luiz (PMDB) trocou de 5 de março para 30 de setembro a homenagem aos policiais civis aposentados. Celina Leão (PDT) optou por fazer deferência aos conterrâneos. Ela apresentou projeto de lei (PL) que cria o Dia dos Goianos, a ser comemorado em 12 de setembro (leia quadro ao lado).
A religião é um capítulo à parte entre as propostas apresentadas pelos deputados distritais. Ligado à Igreja Batista, o presidente da Casa, Wasny de Roure (PT), sugeriu aos colegas que a Associação de Advogados Evangélicos de Brasília fosse considerada uma entidade de utilidade pública. Celina Leão propôs a criação do Dia do Jovem Adventista, enquanto Rôney Nemer (PMDB) homenageou os vicentinos — sociedade apostólica fundada em 1625 por São Vicente de Paulo, em Paris.
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Novo filão
Nos últimos anos, o crescimento vertiginoso da busca por um cargo na administração pública criou uma categoria de potenciais eleitores: os concurseiros. De olho nesse filão, muitos deputados apresentaram PLs para atender esse grupo. Rôney Nemer tratou de isentar os candidatos desempregados da taxa de inscrição. Projeto de Celina Leão determina que seleções promovidas pelo Governo do DF não podem ser marcadas para uma mesma data. A inserção nos editais da disciplina história do Distrito Federal foi sugerida por Benedito Domingos (PP).
Herdeira política do pai e possível integrante de uma chapa ao GDF em outubro, Liliane Roriz (PRTB) apresentou sugestão para aprimorar uma das políticas criadas pelo ex-governador: os restaurantes comunitários. Caso seja aprovado o PL nº 1.391/2013, os estabelecimentos que oferecem refeições por R$ 1 serão obrigados a aceitar como opção de pagamento cartões de crédito e de débito.
Entre os projetos com contornos esdrúxulos, um parece não ter concorrência. De autoria do deputado Washington Mesquita (PTB), o Projeto de Lei nº 1489/2013 cria o pipódromo. Sim, um espaço público seguro destinado aos “amantes das pipas”. O texto destaca que tal iniciativa ficará a cargo do GDF, assim como a oferta de locais que promovam eventos, cursos e campeonatos para crianças e adultos. “Muitas propostas, de tão absurdas, caem no nível do anedótico, do folclórico”, analisa Gil Castelo Branco.
Em entrevista ao Correio na última quinta-feira, o presidente Wasny de Roure reconheceu certa negligência dos colegas na apreciação das próprias matérias apresentadas. Hoje, são mais de 100 itens na pauta da Câmara Legislativa, a maioria de autoria dos próprios parlamentares. A qualidade, segundo ele, é discutível. “Qual é o significado daquela matéria? Daquela construção? Qual o alcance social? Qual a mobilização? Isso está ligado à maneira como o parlamentar faz política na cidade”, reconheceu.
Utilidade questionável
Confira exemplos da produção dos deputados distritais da atual legislatura:
» É débito ou crédito? — PL n° 1.391/2013
Preocupada com a dificuldade de os frequentadores dos restaurantes comunitários pagarem apenas em dinheiro pelas refeições, a deputada Liliane Roriz (PRTB) apresentou PL para obrigar os estabelecimentos a aceitarem cartões de crédito e débito. Detalhe: o valor cobrado nas unidades é R$ 1.
» Dia dos Goianos — PL n° 540/2011
Nascida na capital goiana, Celina Leão (PDT) quer que 12 de setembro seja comemorado no DF como o Dia dos Goianos. Caso a proposta seja aprovada, a data será incluída no Calendário de Eventos Oficiais do Distrito Federal.
» Concessionárias ecológicas — PL nº 721/2012
O petista Cláudio Abrantes apresentou projeto de lei que obriga as concessionárias de automóveis a plantarem árvores como forma de compensar o efeito estufa provocado pelos carros vendidos por elas.
» Sem troco, passagem liberada — PL nº 78/2011
Eliana Pedrosa (PPS) optou por uma opção prática para o problema da falta de troco entre as empresas de transporte público do DF. Caso não haja dinheiro em caixa para devolver a diferença, o passageiro viaja de graça.
» Concurso grátis — PL nº 677/2011
Compadecido da situação econômica dos concurseiros, Rôney Nemer (PMDB) propôs que eles sejam liberados do pagamento da taxa de inscrição em seleções locais. Segundo o deputado, é preciso garantir igualdade de condições entre quem disputa vagas na administração pública.
» Pipódromo? — PL nº1.489/2013
A proposta de Washington Mesquita (PTB) de criar o pipódromo é motivada pela necessidade de garantir espaços seguros para crianças e adultos brincarem com papagaios no DF. “Segundo informações, existe um grupo de cidadãos brasilienses que soltam pipas frequentemente no Guará, mais precisamente na QE 38, onde nunca houve um acidente sequer. Além disso, eles fazem intercâmbio com soltadores de Goiás”, explica o texto.
» Bye, bye, servidor — PL nº 1.015/2012
O deputado Aylton Gomes (PR) decidiu fazer um afago nos funcionários públicos da administração local ao propor, em projeto de lei, o Dia da Despedida do Servidor Público. Ele justifica a proposta: incluir esse dia no calendário oficial do DF é manifestar respeito e promover a valorização desses funcionários.
Fonte: Correio Braziliense, acessado em 07/04/2013